Você gosta de mascar chiclete? Às vezes, serve para refrescar o hálito, para saborear algo doce ou mesmo para relaxar. Depois do descarte, o upcycling de chiclete mascado traz novas oportunidades para o que até então era só um rejeito.
Chicletes são um doce passatempo, mas depois que perdem o gosto e endurecem na nossa boca, o que fazer? Jogar no chão não deveria ser uma opção, mas infelizmente acontece muito. O problema é que o prejuízo ao meio ambiente desse pequeno lixo que parece inofensivo, é grande.
Pequenos lixos, grandes impactos
“Ah, mas é só um chicletinho.” Tudo bem, só que essa pequena goma de mascar é feita de borrachas sintéticas e polímeros derivados do petróleo que irão levar, pelo menos, 50 anos para se decompor.
É isso mesmo, se você passar por uma calçada hoje e ver um chiclete grudado por lá, é bem possível que, daqui a 50 anos, ele continue lá, firme e forte.
Para piorar, esses rejeitos expostos nas ruas podem acabar indo parar na cadeia alimentar de aves, pets e, até mesmo de peixes, o que não faz bem aos animais. Muitos morrem asfixiados ou por inanição.
Além disso, há ainda suas embalagens, que muitas vezes são feitas de plástico.
Só no Brasil, consumimos 18 milhões de gomas de mascar todos os dias. Globalmente são cerca de 560 milhões de toneladas por ano. Já percebeu que o problema acaba ganhando proporções enormes quando colocamos as coisas em perspectiva?
A verdade é que, num mundo ideal, as pessoas abririam mão de mascar chiclete em prol do meio ambiente. Dariam preferência a outros confeitos, mas isso, talvez, seja pedir demais.
Por isso, outras soluções menos radicais estão sendo desenvolvidas e o upcycling é um aliado.
Chiclete grudado no meu sapato?
Chiclete grudar no sapato é desagrável e inconveniente, mas e se toda a sola do seu calçado fosse feita de chiclete? A ideia veio da mente da designer britânica Anna Bullus.
Anna descobriu que as gomas de mascar são o segundo lixo mais comum nas ruas do mundo todo, só atrás das bitucas de cigarro. E, a partir disso, ela pensou: “O que eu posso fazer para tranformar isso em algo útil?”
Ao começar a pesquisar sobre os processos químicos por trás da fabricação do chiclete, ela descobriu que a maioria é feita de borracha sintética, bem parecida com o plástico. O nome é poliisobutileno e é o mesmo material usado dentro dos pneus de bicicleta, por exemplo.
O que Anna percebeu é que, mesmo depois de mascada, a goma ainda é um material versátil e muito útil. Mas antes de fabricar as solas de sapato feitas de chiclete ela precisava coletá-los.
Então, a designer criou coletores rosas e bem chamativos para descarte das gomas e os espalhou pela cidade. O nome dessas caixas: Gumdrop. E, aliás, os próprios coletores já são fruto de upcycling de chiclete mascado, afinal, qual o melhor material para chamar atenção para a causa do que um feito do próprio alvo da campanha?
Nas Gumdrop fica uma mensagem que informa que os chicletes coletados serão reciclados em novos produtos.
A Universidade de Winchester foi o primeiro lugar no país a receber os coletores feitos por Anna. Depois, foi a vez do Aeroporto de Heathrow que notou, 3 meses depois da instalação das Gumdrops, uma economia de 6000 libras nos custos com limpeza de chicletes que antes eram descartados incorretamente.
Da boca para o pé: sola de sapato feita de chiclete upcycled
Depois recolher quantidade suficiente de chiclates, Anna precisava de parceiros da indústria que estivessem dispostos a embarcar na ideia de usar chicletes mastigados para produzir as solas de sapato.
A única que se convenceu foi uma empresa especializada em moldagem de plástico, chamada Amber Valley.
A partir daí, Anna cria os designs dos produtos (que precisam levar, no mínimo, 20% da goma de mascar upcycled) e a Amber Valley os produz.
A mistura de goma é aquecida em alta temperatura antes de ser expelida em uma máquina de injeção. Posteriormente, a mistura contendo a goma de mascar velha é colocada em uma máquina de moldagem por injeção. Ela é aquecida e depois liberada como uma pasta, que pode ser moldada em novos objetos à medida que esfria.
Expandindo os horizontes
O que começou apenas com a ideia dos coletores públicos de chiclete em 2011, depois passou para as solas de sapato e, atualmente, conta com diversos produtos.
Expandindo os negócios para a Dinamarca e EUA, a Gumdrop agora vem trabalhando no upcycling de chiclete mascado para produzir uma linha de botas infantis.
Além disso, Anna também fez uma parceria com uma marca de design de Amsterdã, chamada Explicit Wear, para fabricar tênis de gomas de mascar retiradas das ruas da capital holandesa, transformada em grânulos e moldada na sola do sapato, que leva o mapa da cidade.
O primeiro tênis de chiclete upcycled atende pelo nome de Gumshoe. Disponível em três opções de cores: rosa, preto ou vermelho e custam cerca de 190 euros.
Essa ideia chamou a atenção de uma gigante do mercado, ninguém mais ninguém menos do que a Adidas, que lançou uma versão do icônico Stan Smith, usando a sola de chiclete da Gumdrop.
Por fim, a Gumdrop também comercializa copos feitos de chiclete mascados e mini coletores individuais portáteis, para você descartar seu chicle da forma certa.
A Gumdrop abriu caminho para outras criações seguindo a técnica de upcycling de chiclete mascado
Em 2021, dois estudantes de design franceses, Hugo Maupetit e Vivian Fischer, também tiveram uma ideia que iria, literalmente, tirar os chicletes das ruas para, depois, colocá-los de novo, mas de uma forma diferente.
Na forma de rodas para skate.
Primeiro, eles criaram um painel colante onde as pessoas poderiam grudar seu chiclete usado, e os espalharam pela cidade de Nantes. Posteriormente, as gomas de mascar eram recolhidas semanalmente, e moídas junto com a própria placa de coleta, que é feita de plástico.
Durante as primeiras fases do projeto, os estudantes precisavam de 10 a 30 chicletes por roda. A goma de mascar é misturada com aglutinante e corantes naturais para, depois, ser moldada por injeção para criar a roda final do skate, que pode ser adquirida em 4 tamanhos diferentes.
Agora, o melhor de tudo é que esse é um sistema circular porque, uma vez que a roda feita de chiclete esteja desgastada, ela pode ser novamente triturada e derretida para criar uma nova.
Hugo e Vivian agora miram em objetivos mais altos: uma parceria com a Vans, maior marca de skate do mundo, e a marca Mentos, uma das maiores de chiclete do planeta.
A ideia dos dois é espalhar essa ideia para além de Nantes e ajudar a limpar as ruas de toda a Europa.
Upcycling em toda a indústria – um sonho possível
Quando parece que não é possível valorizar um resíduo, sempre nos surpreendemos com a criatividade e o desejo de tornar o planeta um pouco mais sustentável.
Histórias estas servem como inspiração para enxergar o poder de mercado que o upcycling tem, e os produtos que nascem dele.
Ou seja, lucro e sustentabilidade podem sim andar juntos.
Referências: Stir World, Meio Ambiente Rio, Setor Reciclagem, The Verge
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