O caminho do alimento da origem à mesa é cada vez mais longo e complexo. Isso torna muito difícil rastreá-lo. Há uma nova arma para assegurar a procedência alimentar: blockchain. Sim, elas saíram das bitcoins direto pro seu prato.
O mundo já presenciou escândalos devido à falta de transparência nesta cadeia. Um dos casos mais lembrados é o da carne de cavalo que era vendida como sendo de vaca na Europa. Mas há inúmeros outros casos de fraudes, uso de mão de obra escrava, falsificações, rótulos com dizeres mentirosos. Os métodos de controle atuais já não são suficientes para este problema crescente. Em quem podemos confiar?
É neste contexto que entra a tecnologia blockchain. Implementada pela primeira vez no ano de 2009, ela é a principal inovação técnica que possibilitou o surgimento das bitcoin, a mais conhecida moeda virtual da atualidade.
Esqueça a especulação, falta de lastro e uma série de problemas com bitcoin, o que nos interessa aqui é apenas a tecnologia por trás disso.
As blockchain consistem em blocos de estrutura de dados que contém informações. No caso das bitcoins isto funciona como um livro-razão público compartilhado, contendo um registo de cada transação feita. Na cadeia de abastecimento o princípio é o mesmo, há registo de todos os elos envolvidos na criação e distribuição desde a matéria-prima até o produto acabado para o consumidor. Não é uma alternativa aos mecanismos existentes de logística, mas sim o seu complemento.
Os produtos recebem etiquetas com sensores RFID contendo QR Codes e em cada etapa se adicionam informações de local, data, qualidade ou qualquer outro dado sensível. Por não armazenar os dados num servidor central e sim mantê-los espalhados nos computadores conectados à rede, não há intermediários para processar transações. E ainda: pode-se adicionar registos, mas nunca remover ou alterá-los, isto torna a rede ainda mais segura.
As possibilidades são muitas: usa-se blockchain para assegurar a autenticidade de remédios, acompanhar a distribuição de produtos agrícolas, prevenir a rotulagem errada de alimentos orgânicos, facilitar os processos de auditoria, fornecer estatísticas confiáveis, identificar pontos de falha, atrasos e perdas de mercadoria, encontrar a origem de surtos e rotas de determinadas pragas e muito mais.
Na cadeia de abastecimento ela garante transparência e eficiência para as indústrias. Já há algumas startups explorando a tecnologia. A inglesa Provenance atua no rastreamento de alimentos enquanto a Filament está a criar fazendas inteligentes com a blockchain aliada à IoT (internet das coisas). Até mesmo grandes empresas já apostam nela, o Walmart está a utilizar a blockchain para garantir a procedência da carne de porco comercializada em suas lojas na China.
E o consumidor? Este passa a ter o poder nas mãos, pode consultar as informações quando quiser e decidir o que comprar baseado em seu valor real. A pergunta que não quer calar: você realmente vai usar esse conhecimento para fazer escolhas mais conscientes mesmo que não sejam as mais baratas ou vai olhar para o outro lado e fingir que não é com você?
Publicado originalmente na minha coluna da revista i9 magazine em 22/02/2017 e atualizado em 13/01/2018.
COMMENTS